24/03/2011

um sonho que não sonhei

Entrei em um antigo cine-teatro, de chão e paredes de madeira, poltronas de tecido vermelho, com uma tela de projeção em um palco redondo. As cortinas estavam abertas. Sentei, apagaram-se as luzes. O filme projetado tinha um aspecto de sonho ou lembrança de infância, como uma fotografia antiga de cujas cores, cenário e contexto a história fora remontada.

Dia ensolarado em uma praia de areia e águas claras. Foco difuso ou concentrado em um ponto impreciso entre a câmera e a cena.

Estava minha mãe, ainda adolescente, de maiô, em pé na areia, levemente inclinada para frente, com as mãos no pescoço e os braços rentes ao corpo. Sua expressão estática, boca aberta, parecia chamar alguém no mar.

À esquerda e mais ao fundo, sentada sob um guarda-sol, de cabelos escuros, estava minha avó, cuja silhueta turva não se distinguia da paisagem.

No mar, brincavam meus tios muito jovens. A cena era cheia de movimento: os braços agitando a água, as penas sacudindo sem tocar o fundo, a gargalhada escancarada nos dentes. Aquele rosto magro de nariz comprido e afilado, era meu tio que nunca conheci. Não consegui focar seu rosto. Quanto mais enquadrava a imagem e ampliava o detalhe, mais se tornava embaçado e indistinguível.

Acenderam-se as luzes. Entrou no palco uma mulher contando ópera. Na cadeira ao meu lado havia um libreto. “A interpretação dos sonhos”, de Freud, era interpretada naquela canção.

Acordei perturbado com aquelas imagens e procurei remontar a história. Perguntei, afinal, quem poderia ter visto aquela cena, quem estaria com a câmera na mão, ou de quem seria aquela lembrança. O único personagem que não era visto era meu avô.

2 comentários:

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Saudade